sexta-feira, 18 de agosto de 2017

Uma visita à PG



Uma vez, um primo meu virou e me disse do nada: Lívia, não é incrível? Quando paramos pra pensar nessas pessoas em volta da gente... Cada uma tem uma história, como se coubesse um universo inteiro em cada uma delas. Aquela ali tem um, aquela tem outro, todos diferentes, todos enormes...

Isso já tem tempo, mas nunca me esqueci desse comentário que ele fez.

Uma das coisas mais incríveis da profissão de professor é o fato de estarmos em constante contato com pessoas, as quais, por sua vez, são esse universo de histórias. Poder conhecê-las é um privilégio, mas nem sempre é possível, pois demanda tempo, tão escasso nessa nossa correria maluca de todos os dias.

Logo, nem sempre podemos saber como aquela pessoa chegou ali, sua trajetória, suas motivações, tristezas, percalços. Pena... Aprenderíamos a valorizar mais quem está perto de nós se soubéssemos disso. Sempre temos que ter essa visão quando olhamos para alguém, pois, quando pensamos na carga que aquela pessoa na nossa frente carrega, o tanto que já atravessou, damos mais importância a quem Deus colocou em nossas vidas.

Enfim... Dia desses estava de recesso e recebi uma mensagem: meu aluno PG (meu aluno Down) estava com pneumonia. A nona. Pensei: ué, vou visitá-lo.

Estava um dia lindo. O hospital era longe de minha casa, mas só a paisagem do caminho já valeu a pena.

Pensei que encontraria um menino amuado ao lado de uma mãe cansada.

Que nada! PG estava com a carinha boa, esperto como sempre. Sua mãe, guerreira como todas as mães, estava ali, firme, cuidando de tudo, com aquela força cuja fonte só tenho uma explicação: Deus.

Entreguei o presente. Ele não estava muito a fim de papo. Demorou a tirar a colcha do rosto (com a qual cobriu a cabeça assim que me viu hehehe).

- Coração de mãe sente, professora. Ele não estava bem no sábado. Sabia que algo estava errado. Corri para o hospital, a saturação estava muito baixa quando chegamos. Ele nem passou pela emergência. Já correram com ele pra UTI...

E assim fui conversar com sua mãe, aquele universo de histórias diante de mim...

Ela já tinha duas filhas. Com mais de 40 anos, mesmo tomando injeção de anticoncepcional, engravidou de PG. Um susto! Nada foi detectado na ecografia morfológica e em nenhum exame. Aos 8 meses, teve de passar por uma internação. Após esse período, uma cesária confusa, com médicos um tanto perdidos, veio a pergunta após verem o bebê:

- Sua família tem olhos amendoados?

Ela não entendeu.

- Achamos que seu filho pode ter síndrome.

Síndrome? Que síndrome? Qual síndrome?

Ah, sim, Síndrome de Down, explicaram depois. Eles desconfiavam, mas só um exame (cariótipo) poderia dizer.

Um mês após, o resultado saiu. Positivo. O chão se abriu, engolindo também seu esposo, até então forte.

O que é Síndrome de Down? Para ela, era apenas um rostinho diferente... O que vinha com isso?
Pesquisou... Entendeu. Se preparou. Seguiram-se cirurgias, internações, pneumonias... Haja coração de mãe!

Ela não reclamou em momento algum, o que seria perfeitamente compreensível se acontecesse também. Estava no hospital há dias sem sair, pois não tinha com quem revezar (o marido era autônomo e tinha de trabalhar; sua filha, mesmo com 16 anos, já trabalhava como menor aprendiz; a outra, louca por PG, mora nos Estados Unidos). Contava suas histórias com um sorriso e muito amor, dando aquelas olhadas de mãe de vez em quando para seu filho, que sempre respondia esse olhar com um sorriso...

Saí de lá admirada com a força daquela mãe e com a riqueza de vida de PG, mesmo com apenas 6 anos. Não sabia, mas agora a enxergo diferente. E também PG. Antes, ele era um rostinho. Agora, sei um pedacinho do universo por trás dele. E posso dizer que é encantador!

Uma simples visita se tornou uma grande lição: cada pessoa é, realmente, um universo, cheio de descobertas e aprendizados para quem aceitar entrar nele por um instante e partilhar de seu brilho...

sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Situações fofas com crianças (parte 3)

Aí você vai de princesa para a escola. Seu aluno te vê e pergunta:

- Tia, você está vestida de Fera?

Ok, essa não foi fofa. Devo ficar preocupada com minha aparência? Hehehehe


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O lanche era pipoca. Todos comiam felizes e eu pergunto:

- Gente, de onde vem a pipoca?

Minha aluna responde:

- Uai tia, lá da cozinha.

- Ok, faz sentido, mas eu queria dizer que vem do milho.

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- Tia, eu amo todos os seus colares, brincos e pulseiras. Todos são lindos!

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-Ué, gente. Que brincadeira é essa? Eu não conheço...

- É porque ela é dos nossos tempos, tia.

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- Gente, vocês viram que gracinha? O PG (criança com Down de minha sala) está todo falante! Aprendeu palavras novas, repete o que vocês falam. E isso é graças a vocês, que sempre ajudam a cuidar dele e brincam com ele. Repararam em como ele está falando mais?

- Não...

Ok, então. Valeu...

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- Tia, você está linda hoje.

- Isso, você está charmosa.

Que autoestima fica baixa com isso, não é?

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Aí você tem uma aluna que não quer mais ir para a escola porque você brigou com ela. Você tem uma longa conversa com a turma explicando que só briga com motivo e que não quer ninguém triste para ir à escola. Aí outra aluna responde:

- Tia, eu nunca vou deixar de vir para a escola por sua causa porque eu te amo.

Quem aguenta?
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Aí seu aluno chega todo empolgado e te dá uma paçoca. Você diz:

- Oba, obrigada! Eu amo doce!

Perto da hora do lanche, ele chega perto de você e diz:

- Professora, se você não quiser mais comer a paçoca, pode me devolver, tá?

Você ri e diz:

- Não, Willian, pode pegá-la lá em cima da mesa.

Ele nem pensa duas vezes e “cata”a paçoquinha. E aquela história de “deu, tá dado, e não se fala mais nisso?”. Fiquei sem meu docinho. :-(

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- Tia, o Luca deu um beijo na Paula.

- Mas foi no rosto, é beijo de amiguinho.

- Isso. Na boca é só adulto né, tia? Eu só vou beijar na boca quando eu casar.

Acho que o pai dela vai gostar disso hehehe.

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Aí você vai de bruxa pra escola e escuta uns dias depois:

- Oi bruxa!

E a coleguinha da criança responde:

- Respeita a professora da minha prima!


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O dia amanhece gelado. Você vai pra escola empacotada: cachecol, touca, blusa grossa e calça. A aluninha te vê e diz:

- Ai tia, você está tão quentinha!

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- Gente, o lanche hoje é pipoca.

Aí a criança te interrompe, o olho quase brilhando, pulando da cadeira:

- É com manteiga, tia?


Se você perdeu a parte 1, acesse aqui: goo.gl/jMYcU3

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sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Quando o recesso acaba...


Se tem uma época do ano em que eu quero muito voltar a ser criança é na volta do recesso ou das férias. Como é difícil ser adulto nesse tempo...

Entenda. Você está naquela correria louca de todos os dias.

De repente, tem alguns dias off... Aí você consegue dar atenção ao marido direito, arrumar a casa, fazer aquelas tarefas adiadas há muito tempo, terminar as suas coisas... E dá tempo de tudo e ainda sobra! Você se sente feliz, risca na agenda  as tarefas concluídas com orgulho, atinge suas metas e sorri pras paredes! E o melhor: sem se sentir atropelada por um caminhão, de frente e de ré, ao final do dia.

Mas então os dias “de folga” acabam e bate aquele desânimoooo. Você se lembra de tudo que terá que fazer, dos possíveis  problemas que virão, das raivas que vai passar... Poxa, eu gosto do que faço, mas não vou mentir: não fico pulando de alegria quando meu recesso ou férias acabam, não. Dá uma ansiedade e preocupação terríveis...

E aí bate aquela sensação: quero voltar a ser criança. Essa vida de adulto é muito difícil, não consigo lidar. É muita coisa para conciliar e eu simplesmente não dou conta. Quero voltar a não ter esse tipo de preocupação, ansiedade, dor na barriga, nervoso. Será que pode?

Não. Só tem uma saída: encarar.

O que acaba sendo bom, porque nos fortalece, nos faz mais resistentes para outras situações parecidas no futuro.

Mas enfim, voltei a trabalhar. O primeiro dia de aula acabou sendo bom, melhor do que eu pensava. Ninguém chorou com saudade de casa. Só uma chegou de “cara feia”, mas logo melhorou. E tive agradáveis surpresas:

- Ver como alguns cresceram e ficaram mais gorduchos;

- Muitos dentinhos caíram nas férias, e eles exibiam orgulhosos suas janelinhas. Amo quando isso acontece!;

- É muito legal ouvir suas histórias e novidades. E bota história e novidade nisso, nunca vi tanto assunto;

- Ganhar desenhos e abraços;

- Ver o quanto já se desenvolveram e ver que, de alguma forma, você participou disso.

É, fácil não é. Sei que terei noites mal dormidas, sono acumulado, 1 milhão de tarefas e planejamentos, passarei raiva, terei mil problemas pra resolver, ouvirei a palavra “tia” mais vezes do que achava ser possível, amarrarei um zilhão de sapatos...

Mas o jeito é enfrentar de cabeça erguida, focando na parte boa de ser professora, tentando levar essa minha profissão de maneira mais leve (na medida do possível), aprendendo a ser mais grata a Deus por ter um emprego, ainda mais nessa época de crise.

E, claro, relembrar aquilo que a gente adora esquecer, mas que sempre nos dá conforto: não estou só. Deus está comigo e me dará força e alento sempre que eu pedir. É isso que me ajuda a levantar quando o despertador toca e eu sei que terei um dia inteiro pela frente!

“lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós.” 1 Pedro 5:7

“não temas, porque eu sou contigo; não te assombres, porque eu sou o teu Deus; eu te fortaleço, e te ajudo, e te sustento com a minha destra fiel”. Isaías 41:10