quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Janelinhas do saber

    Vitória saiu da escola chateada. Seu dente estava mole! Chegou a sua casa, foi no espelho, viu a situação e ficou mais chateada ainda. Como aquilo doía!
   Resolveu então beliscar algo enquanto esperava o almoço. Pegou um pão e deu aquela mordida.
   “Aaaaaaaaaiiiiiiiiiiiiiiiiii. Buáááááááááááááá”.
   Sua mãe entrou correndo na cozinha. Vitória chorava e chorava e segurava seu dentinho. Sua mãe a pegou no colo e levou-a ao espelho para ver seu sorriso: um lindo sorriso banguela! Vitória começou a chorar de novo!
   “Mãe, eu estou horrível! Por que temos que perder os dentes? Por que eles só não vão crescendo junto com a gente igual os braços e pernas e depois param de crescer também? Olha só o tamanho dessa `janelinha`!”.
   Sua mãe riu bastante, mas sabia que, de certa forma, aquilo fazia sentido. Deu um abraço em Vitória e respondeu a sua pergunta:
   “Filha, quando a gente nasce, somos bem pequenininhos e não entendemos direito o que está ao nosso redor. A medida que o tempo passa, vamos aprendendo muito: a andar, falar, as cores, a letrinha com que nosso nome começa, a comer sozinha, os números, o alfabeto... Então, o nosso coração está tão feliz que o nosso corpo responde: para celebrar esse momento, os dentinhos de leite começam a cair, sinalizando que estamos crescendo”.
   “Então, mamãe, por que os dentes da Ana e da Clara lá na escola caíram antes do meu? É porque elas aprenderam mais do que eu?”
   A mãe de Vitória riu. “Não, filha. Cada corpo tem seu tempo: em algumas crianças os dentes caem antes, em outras, depois, mas isso não é nada. Tudo simboliza a mesma coisa: a celebração do nosso crescimento. Se o de seu colega cai antes do seu, não quer dizer que ele é melhor, nem que sabe mais ou que o coração dele está mais feliz. Apenas o corpo dele responde diferente do seu.
  O que importa não é isso, quem é mais ou menos banguela, tem mais ou menos `janelinhas`, como você gosta de dizer. O que importa é que ser banguela não é feio, como você pensa. É lindo por simbolizar que você a cada dia está crescendo mais e mais e aprendendo coisas novas.”
   Vitória enxugou as lágrimas e olhou novamente seu sorriso-banguela no espelho. Agora estava mais feliz. Pensou em quanto já tinha aprendido até ali: já escrevia em letra cursiva, lia frases e pequenos textos. Era uma das últimas da sua turma a perder um dentinho, mas sabia que isso não era o principal. O importante é que a cada dia aprendia algo novo e ser banguela, ter suas “janelinhas”, mostrava isso. Mas então franziu a testa e perguntou:
   “Mamãe, e quando eu tiver sua idade? Vou aprender muita coisa até lá. Meus dentes vão continuar caindo?”
   “Ai, filha, você é uma piada. Não, os adultos não perdem mais os dentes como as crianças. Isso só acontece uma vez e é exatamente na infância porque essa fase é muito especial, a melhor de todas. O que é uma pena. Sabe, Vitória, se a gente perdesse os dentes a cada período que aprendêssemos algo, nos lembraríamos em como é ser criança. De ver como vocês veem, sentir como sentem, sorrir de coisas simples... Parece que perdemos o nosso coração de criança.”
   “Ah, não, mamãe. E se eu crescer e ficar assim? Eu não quero. Como faço para crescer, mas continuar tendo o coração de criança?”
   “Filha, isso é mais fácil do que pensamos. Trocamos dentes, mas continuamos com o mesmo coração. Se quisermos continuar com a visão de criança, devemos crescer nunca deixando de se maravilhar com o mundo, ser sensível ao nosso próximo, rir com pureza. Preste atenção em você, seus amigos, repare nas suas atitudes. Guarde isso em seu coração para não deixar a dureza da vida tirar isso de você, como muitos adultos fazem.”
   Vitória então deu um pulo. “Mas mamãe, olha que coisa boa. Já que o nosso coração não cai e ganhamos outro, como nosso dentinho, todo adulto que quiser pode voltar a se sentir como criança. É só se concentrar, observar a gente, relembrar como era e pronto, o coração descongela.”
   A mãe de Vitória lhe deu um beijo e a abraçou. “Isso mesmo, filha. Viu como vocês crianças são especiais? Pensam de um jeito que nós, adultos, esquecemos.
   Ah, e só para reforçar: você ficou linda com essa janelinha!”
   “Obrigada, mamãe”.
   E Vitória ia saindo, quando abriu um sorrisão para sua mãe e disse: “Mamãe, ainda bem que trocamos o nosso dentinho e não nosso coração, não é?”.
 

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